Com a Reforma Tributária, o Brasil instituiu o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), alterando de forma relevante a tributação sobre operações com bens imóveis. Para quem recebe aluguéis, a diferença entre atuar como pessoa física (PF) ou pessoa jurídica (PJ) ganhou novas camadas: na PF, há IRPF progressivo e, em certos casos, incidência de IBS e CBS por habitualidade; na PJ, a não cumulatividade de IBS e CBS e a possibilidade de créditos tornam a carga mais previsível. A seguir, explicamos os pontos essenciais e trazemos quadros comparativos.
IRPF progressivo na locação (PF)
Base de cálculo e deduções
Na locação recebida por pessoa física, a tributação é pelo carnê-leão, seguindo a tabela progressiva mensal do IRPF, a mesma de salários e aposentadorias. A base de cálculo, na prática, é a receita de aluguéis recebida, com deduções limitadas (por exemplo, IPTU, condomínio e corretagem pagos pelo locador). Isso faz com que, para tíquetes médios e altos, o contribuinte frequentemente alcance a alíquota marginal de 27,5% rapidamente, elevando a carga efetiva.
IBS e CBS para PF com habitualidade: quando a PF vira contribuinte
Critérios objetivos da LC 214/2025
A Lei Complementar 214/2025 prevê que a PF que realiza operações com bens imóveis pode ser considerada contribuinte do regime regular de IBS e CBS quando configurada a habitualidade. No caso de locação, a PF será enquadrada como contribuinte no ano-calendário seguinte se, no ano anterior, ocorrerem simultaneamente os dois requisitos:
- Receita total com locação, cessão onerosa ou arrendamento de imóveis superior a R$ 240.000 no ano-calendário anterior; e
- Mais de 3 imóveis distintos locados no ano-calendário anterior.
Além disso, há gatilho no próprio ano para certas situações. Se a locação no ano corrente exceder em 20% o limite de R$ 240.000 (isto é, ultrapassar R$ 288.000), a PF pode ser considerada contribuinte já no ano em curso em relação à operação que superou o limite. Nesses casos, a PF passa a recolher IRPF progressivo + IBS + CBS, sem direito a créditos de IBS/CBS, pois a PF não opera no regime não cumulativo.
Curta duração e equiparação à hospedagem
Locações residenciais de até 90 dias ininterruptos são equiparadas a serviços de hotelaria para fins de IBS/CBS, submetendo-se ao regime específico. Isso afeta plataformas e contratos de temporada: exige cadastro do prestador, emissão correta de documento fiscal, recolhimento por destino, descrição de serviços agregados (limpeza, enxoval, portaria) e cláusulas claras de check-in e check-out. É essencial ajustar a precificação ao novo custo, prever responsabilidade pelo repasse dos tributos e evitar fracionamentos artificiais para burlar o limite. Ultrapassado o prazo, aplica-se a regra ordinária; compliance reduz autuações e litígios fiscais relevantes.
Pessoa Jurídica: tratamento e planejamento
Não cumulatividade e créditos
Na pessoa jurídica, IBS e CBS operam no regime não cumulativo, permitindo compensar créditos de bens e serviços vinculados à atividade, como manutenção, corretagem, honorários, energia, limpeza e terceirizações, conforme regras legais. Esse mecanismo reduz o efeito cascata e aproxima a carga tributária da margem real do negócio, favorecendo precificação e planejamento. Ao registrar de forma sistemática as notas de entrada, a empresa abate débitos nas saídas, estabiliza o fluxo de caixa e ganha previsibilidade. Com contratos de repasse, governança e controle de custos, o resultado tende a ser competitivo.
IRPJ e CSLL
Além do IBS e da CBS, a PJ recolhe IRPJ e CSLL (lucro real ou presumido). No lucro presumido, a base é determinada por percentuais fixos sobre a receita e a carga pode ficar na ordem de ~11% a ~14%, variando por atividade, faturamento e adicional do IRPJ. No lucro real, a carga depende do resultado contábil. Em ambos os casos, a possibilidade de repasse contratual e a previsibilidade favorecem a gestão.
Quadros comparativos
A Reforma Tributária instituiu o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), alterando a forma de tributar operações com imóveis. Confira abaixo os pontos principais e os quadros comparativos atualizados.
Pessoa Física – Antes da Reforma
- Receita: R$ 30.000
- IRPF (27,5%): R$ 8.250
- Total tributos: R$ 8.250 (27,5%)
- Líquido: R$ 21.750
Pessoa Física – Depois da Reforma
Até 3 imóveis ou até R$ 20 mil/mês: apenas IRPF até 27,5%.
Mais de 3 imóveis e/ou receita > R$ 20 mil/mês:
- Receita: R$ 30.000
- IRPF (27,5%): R$ 8.250
- CBS/IBS (7,95% sobre R$ 27.000): R$ 2.146
- Total: R$ 10.396 (~34,6%)
- Líquido: R$ 19.604
Pessoa Jurídica – Antes da Reforma (Lucro Presumido)
- Receita: R$ 30.000
- Base presumida (32%): R$ 9.600
- IRPJ (15%): R$ 1.440
- CSLL (9%): R$ 864
- PIS + COFINS (3,65%): R$ 1.095
- Total: R$ 3.399 (~11,3%)
- Líquido: R$ 26.601
Pessoa Jurídica – Depois da Reforma (Lucro Presumido + CBS/IBS reduzido)
- Receita: R$ 30.000
- Base presumida (32%): R$ 9.600
- IRPJ (15%): R$ 1.440
- CSLL (9%): R$ 864
- CBS/IBS (7,95% sobre R$ 27.000): R$ 2.146
- Total: R$ 4.450 (~14,8%)
- Líquido: R$ 25.550
Quadro comparativo
Situação | Tributos principais | Alíquota efetiva | Líquido (R$ 30.000) |
PF – Antes da Reforma | IRPF até 27,5% | 27,5% | R$ 21.750 |
PF – Depois da Reforma (≤3 imóveis ou ≤20k/mês) | IRPF até 27,5% | 27,5% | R$ 21.750 |
PF – Depois da Reforma (>3 imóveis ou >20k/mês) | IRPF + CBS/IBS reduzido | 34,6% | R$ 19.604 |
PJ – Antes da Reforma | IRPJ + CSLL + PIS/COFINS | 11,3% | R$ 26.601 |
PJ – Depois da Reforma | IRPJ + CSLL + CBS/IBS reduzido | 14,8% | R$ 25.550 |
Por que não usar Lucro Real neste contexto?
- A margem típica de locação não demanda as complexidades do Lucro Real.
- O compliance e o custo operacional geralmente superam eventuais ganhos.
- Créditos de IVA relevantes já são aproveitados via não cumulatividade no Lucro Presumido.
- Exceções pontuais podem justificar análise caso a caso (ex.: receitas acessórias como antenas e serviços agregados).
Checklist prático para implementar a PJ
Societário
- Holding/administradora LTDA com objeto social adequado.
- Cláusulas de governança e sucessão.
Tributário
- Lucro Presumido compatível.
- Não cumulatividade de IBS/CBS.
- Mapeamento de despesas creditáveis (manutenção, honorários, energia, limpeza, terceirizações).
Fiscal/operacional
- Cadastro e emissão correta de documentos fiscais.
- Apuração e escrituração de IBS/CBS.
Contratos
- Repasse de tributos, cláusulas de reajuste, garantias.
- Em temporada: regras de check-in/check-out, enxoval, limpeza.
Controles
- Fluxo de caixa, vacância, manutenção preventiva.
- Compliance e auditoria periódica.
Revisão extraordinária
- Avaliar receitas atípicas que possam justificar estudo específico (ex.: contratos de antenas).
O que muda na prática e como decidir
Para PF sem habitualidade
Seguir no CPF pode ser vantajoso quando a carteira é pequena, a receita anual fica abaixo dos limites legais e a operação é esporádica. Mesmo assim, vale organizar o carnê leão, registrar contratos e comprovantes de despesas para evitar autuações. Revise cláusulas de reajuste, repasse de encargos, garantias e prazos, mantendo previsibilidade de caixa. Considere provisionar tributos, negociar índices e analisar vacância. Se o patrimônio crescer, reavalie o enquadramento e formalização de rotinas com suporte contábil. A decisão deve equilibrar simplicidade, custo de compliance, risco fiscal, objetivos patrimoniais e liquidez.
Para PF com habitualidade
Com os critérios legais configurados, a pessoa física torna-se contribuinte de IBS e CBS, além do IRPF progressivo, sem direito a créditos. A carga pode subir e a previsibilidade financeira cair, especialmente com tíquetes elevados e contratos. Por isso, vale simular o ano inteiro, projetar reajustes, vacância e custos operacionais, e compliance, e revisar cláusulas de repasse e recomposição. Avalie migrar para PJ para acessar a não cumulatividade, créditos sobre insumos e serviços e contratos mais transparentes. Considere governança, custos de constituição, rotinas contábeis e objetivos patrimoniais de longo prazo.
Para PJ com carteira estruturada
A PJ tende a oferecer previsibilidade e otimização no médio prazo, especialmente com escala, rotinas de manutenção e serviços terceirizados creditáveis. A escolha entre lucro presumido e real, bem como a modelagem contratual, deve ser feita caso a caso.
Conclusão: análise personalizada e suporte jurídico
A comparação entre pessoa física e pessoa jurídica diante do IBS e da CBS depende de números concretos (receita anual, quantidade de imóveis, perfil dos contratos, custos de manutenção) e de objetivos de governança e sucessão. Uma análise personalizada define a melhor rota para cada perfil de investidor.
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